Fato do Príncipe ou Força Maior Como Motivo de Rescisão Contratual – Nota SEPRT

A Secretaria Especial de Previdência e Trabalho publicou a Nota Informativa SEI/SEPRT 13.448/2020 que visa conceituar o entendimento sobre alegação de fato do príncipe ou de força maior como motivo para rescindir contratos de trabalho durante o estado de calamidade pública.

A referida nota visa orientar os Auditores Fiscais do Trabalho (especificamente no Estado do Rio de Janeiro), mas tem o condão de servir como referência para os demais estados do país, enquanto não for publicada orientação da Secretaria de Inspeção do Trabalho – SIT (de âmbito nacional) em contrário.

Muitos empregadores, considerando a impossibilidade de manter as atividades empresariais em função da pandemia, estão se utilizando dos seguintes fundamentos para rescindir o contrato de trabalho dos empregados:

  • Fato do Príncipe: previsto no art. 486 da CLT; e
  • Força Maior: previsto no art. 502 da CLT.

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Segundo a Nota Informativa SEI/SEPRT 13.448/2020, há casos de empregadores (que alegam o fato do príncipe) que sequer quitam o saldo de salário devido pelo trabalho já prestado pelo empregado no mês da rescisão, sustentando que o pagamento de todas as verbas rescisórias, salariais ou indenizatórias, ficará a cargo do governo responsável.

Rescisão de Contrato Motivada por Factum Principis (Fato do Príncipe) – Art. 486 da CLT

A teoria do Fato do Príncipe, sob o ponto de vista trabalhista, decorre de uma ação unilateral da Administração Pública (União, Estado ou Município) que produz efeitos sobre as pessoas, inclusive as pessoas jurídicas (empresas), que ficam impedidas ou impossibilitadas de exercerem suas atividades empresariais/comerciais normalmente.

Previsto no art. 486 da CLT, o fato do príncipe dispõe que “no caso de paralisação temporária ou definitiva do trabalho, motivada por ato de autoridade municipal, estadual ou federal, ou pela promulgação de lei ou resolução que impossibilite a continuação da atividade, prevalecerá o pagamento da indenização, que ficará a cargo do governo responsável”.

Assim, uma vez comprovado que a rescisão de contrato de trabalho se deu por conta do fato do príncipe, o empregador estará isento do pagamento da indenização decorrente da rescisão, ficando a autoridade municipal, estadual ou federal, com o ônus desta obrigação.

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De acordo com a Nota Informativa SEI/SEPRT 13.448/2020, “verifica-se que é condição imprescindível para a configuração do fato do príncipe a efetiva paralisação do trabalho ou a impossibilidade de continuação da atividade empresarial – ainda que temporária. Ou seja, o ato da autoridade pública, administradora ou legisladora, deve impedir totalmente o funcionamento do estabelecimento, inviabilizando qualquer prestação laboral“.

Pela nota informativa, se o trabalho continua sendo realizado, ainda que parcialmente, ou de forma adaptada à nova realidade estabelecida pela pandemia, não será caracterizado o fato do príncipe, já que a paralisação parcial não está previsto na letra da lei. A paralisação temporária ou definitiva prevista na lei sugere a paralisação total das atividades.

A exemplo da paralisação parcial (que não configura o fato do príncipe), temos os restaurantes que, embora tenham paralisado o atendimento presencial no estabelecimento, mantiveram o atendimento em forma de entrega em domicílio (Delivery).

De acordo com a nota informativa, se reconhecida a paralisação nos moldes do que dispõe o art. 486 da CLT, “a indenização que passa a ser de responsabilidade do ente estatal é aquela do art. 478 para os trabalhadores ainda estáveis, e, para os não estáveis, a indenização do FGTS prevista no art. 18, §1º, da Lei nº 8.036/90, apenas“.

Significa dizer que a autoridade pública será responsável apenas pela indenização acima descrita, e não pelo total das verbas rescisórias como saldo de salário, férias vencidas e proporcionais acrescidas do terço constitucional, 13º Salário ou outros adicionais devidos, as quais ainda deverão ser suportadas pelo empregador.

De acordo com a Nota Informativa SEI/SEPRT 13.448/2020, sempre que o empregador invocar em sua defesa o fato do príncipe, “o tribunal do trabalho competente notificará a pessoa de direito público apontada como responsável pela paralisação do trabalho, para que, no prazo de 30 (trinta) dias, alegue o que entender devido, passando a figurar no processo como chamada à autoria”, nos termos do que dispõe o §1º do art. 486 da CLT. Trata-se, portanto, de questão que, a rigor, deve ser resolvida judicialmente.

Sobre as rescisões de contrato motivadas por força do príncipe, a Nota informativa estabelece em suma que:

  • Não se admite “paralisação parcial” de trabalho para fins de incidência da hipótese do art. 486 da CLT;

  • Apenas quando existir ato de autoridade municipal, estadual ou federal suspendendo totalmente a atividade será admitida a rescisão do contrato de trabalho com base no fato do príncipe;

  • A incidência da hipótese do art. 486 da CLT não autoriza o não pagamento de verbas de natureza salarial devidas na rescisão contratual ;

  • O Auditor-Fiscal do Trabalho, sempre que se deparar com a alegação de fato do príncipe como motivo para rescisão contratual, deve: 

a) verificar se houve paralisação (total) do trabalho e não continuidade das atividades empresariais, seja temporária, seja definitiva;

b) verificar se existe ato de autoridade municipal, estadual ou federal suspendendo
totalmente a atividade – se há restrição parcial, não se admitirá o fato do príncipe;

c) verificar se foram quitadas as verbas rescisórias, na forma e prazo estabelecidos nos parágrafos do art. 477 da CLT, procedendo à lavratura dos autos de infração pertinentes, quando concluir pela violação de preceito legal;

d) abster-se de exigir o recolhimento, pelo empregador, da indenização compensatória do FGTS prevista no art. 18, §1º, da Lei nº 8.036/90.

Rescisão de Contrato Motivada por Força Maior – Art. 502 da CLT

De acordo com o art. 501 da CLT, entende-se como força maior todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente.

O § único do referido artigo dispõe que a imprevidência do empregador exclui a razão de força maior, ou seja, se há descuido, imperícia ou desleixo por parte do empregador na administração da empresa e, em razão disso, a empresa acaba falindo ou se extinguindo, não se caracteriza a força maior.

De acordo com a Nota Informativa SEI/SEPRT 13.448/2020, “o art. 502 da CLT é o que trata especificamente da força maior enquanto motivo de rescisão de contrato de trabalho, e estabelece a redução, pela metade, dos valores das indenizações rescisórias devidas aos trabalhadores, estáveis (nos termos do art. 492 da CLT) e não estáveis (optantes do sistema indenizatório do FGTS)”.

Quanto à caracterização da extinção da empresa mencionada no art. 502 da CLT,  a citada Nota Informativa dispõe que o processo de extinção de uma empresa ou estabelecimento é um procedimento complexo e o cancelamento da inscrição da pessoa jurídica ocorre apenas após sua liquidação. Portanto, para fins de comprovação do início do procedimento de extinção da empresa deverá ser apresentar, no mínimo, a averbação da dissolução no registro onde a pessoa jurídica estiver inscrita, nos termos do art. 51, §1º, do Código Civil“.

Portanto, não é atribuição do Auditor-Fiscal do Trabalho, no curso da ação fiscal, decidir pela incidência ou não da hipótese de força maior como motivo para a rescisão de contrato de trabalho, já que cabe à autoridade trabalhista verificar se houve, de fato, extinção da empresa ou do  estabelecimento em que trabalha o empregado.

Sobre as rescisões de contrato motivadas por força maior a Nota informativa estabelece em suma que:

  • A incidência da hipótese do art. 502 apenas autoriza a redução pela metade da indenização compensatória do FGTS, prevista no art. 18, §1º, da Lei nº 8.036/90, conforme disposto no §2º do mesmo artigo;

  • Não se admitirá alegação de “força maior” como motivo para rescindir contratos de
    trabalho se não houve extinção da empresa ou do estabelecimento em que trabalhe o empregado;

  • O Auditor-Fiscal do Trabalho, sempre que constatar “força maior” como motivo para rescisão de contratos de trabalho, deve:

a) verificar se há indícios de extinção da empresa ou do estabelecimento em que trabalhe o empregado;

b) notificar o empregador para que este apresente o registro do ato dissolução da empresa na junta comercial ou órgão equivalente, para fins de comprovação do início do processo de extinção;

c) verificar se foram quitadas as verbas rescisórias, na forma e prazo estabelecidos nos parágrafos do art. 477 da CLT, procedendo à lavratura dos autos de infração pertinentes, quando concluir pela violação de preceito legal;

d) verificar se o empregador recolheu, pela metade, a indenização compensatória do FGTS, nos termos do disposto no art. 502, incisos II e III, da CLT, c/c o art. 18, §2º, da Lei nº 8.036/90 – se comprovada a extinção da empresa ou estabelecimento.

e) caso não tenha ocorrido a extinção, verificar se o empregador recolheu integralmente a indenização compensatória do FGTS, nos termos do disposto no art. 18, §1º, da Lei nº 8.036/90.

Fonte: Nota Informativa SEI/SEPRT 13.448/2020 –  Adaptado pelo Guia Trabalhista.

Relações Trabalhistas na Pandemia da Covid-19

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A Prorrogação da MP 936/2020 não Aumenta o Prazo de Suspensão do Contrato Para 120 Dias

De acordo com o art. 8º da Medida Provisória 936/2020, durante o estado de calamidade pública o empregador poderá acordar, mediante contrato individual, a suspensão temporária do contrato de trabalho de seus empregados, pelo prazo máximo de 60 dias, que poderá ser fracionado em até 2 períodos de 30 dias.

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Através do Ato CN 44/2020, publicado em 28/05/2020, o Congresso Nacional prorrogou, por 60 dias, a referida MP 936/2020, tendo em vista que a mesma estava por vencer e ainda não foi apreciada pelo Congresso Nacional.

Importante ressaltar que a prorrogação da MP pelo Congresso não aumentou o prazo de suspensão do contrato para 120 dias, mas apenas a validade da norma.

Significa dizer que os limites para suspensão do contrato de trabalho, por conta da pandemia, ainda continua sendo de 60 dias, e o empregador que ainda não se utilizou deste recurso, poderá fazê-lo a qualquer momento, tendo em vista que a validade da norma foi estendida.

Caso o empregador já tenha se utilizado da suspensão do contrato por 60 dias, a MP 936/2020 ainda prevê que o mesmo se utilize da redução da jornada de trabalho e salário.

Alternativamente, poderá também se utilizar das medidas previstas na MP 927/2020, como as mencionadas aqui.

Tenha acesso a detalhes importantes sobre as medidas trabalhistas durante a Pandemia Covid-19 na obra abaixo.

Relações Trabalhistas na Pandemia da Covid-19

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Reintegração do Empregado e as Consequências no Contrato de Trabalho

Legalmente as empresas não precisam de justificativa para demitir o empregado, ou seja, a condição de empregador, determinada pelo art. 2º da CLT, assegura o direito potestativo de despedir o empregado sem justa causa.

No entanto, este poder não é ilimitado, uma vez que a própria legislação dispõe de algumas situações em que os empregados são revestidos de proteção contra a demissão sem justo motivo ou imotivada.

Uma destas situações é o caso do empregado acometido de doença grave (câncer, por exemplo), cuja doença seja de conhecimento da empresa e ainda assim, demite o empregado sem motivo justificável, caracterizando a dispensa discriminatória, nos termos da Súmula 443 do TST.

Tais previsões limitam o poder diretivo da empresa em agir de forma arbitrária na demissão de seus empregados, obrigando o empregador a indicar o justo motivo dentre os previstos no art. 482 da CLT.

Caso o empregador não indique fundamentadamente o motivo que justifique a justa causa ou se a penalidade aplicada for desproporcional ao ato falho cometido pelo empregado, o empregador estará sujeito a reintegrar o mesmo ao seu quadro de pessoal.

Por isso, antes de proceder a demissão arbitrária, é preciso que a empresa verifique quais são os empregados que possuem estabilidade, ou se o ato falho cometido enseja realmente a rescisão contratual por justo motivo, pois aplicar uma justa causa quando se deveria aplicar uma advertência ou suspensão, por exemplo, configura a aplicação de medida desproporcional.

Clique aqui e veja como o empregador, que é obrigado a reintegrar o empregado demitido injustamente, deve proceder em relação ao salário, férias, 13º salário, verbas rescisórias pagas, multa de 40% do FGTS e anotação na CTPS.

Escrito por Sergio Ferreira Pantaleão, Advogado, Administrador, responsável técnico do Guia Trabalhista e autor de obras na área trabalhista e Previdenciária.

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